
Quando nasce um bebê, nasce também uma nova mãe.
Durante a gravidez ela trabalha a possível realização de infinitas fantasias a respeito do filho: um filho perfeito… amoroso… e bem melhor que os filhos “dos outros”. Lógico, tem que ser assim.
Porém, alguns dias depois do nascimento e quando a aparente rotina começa a tomar conta da vida e dos espaços, aquele bebê, filho perfeito, começa a pedir, demandar, procurar, necessitar coisas que essa mãe tem dificuldade em decodificar e disponibilizar; mesmo estando disposta para niná-lo, sustentá-lo, amamentá-lo e acolhê-lo, surge uma questão e ela sente um medo atroz: “Será que ele vai ficar mal acostumado se eu atender a todas as suas necessidades?”
Esse pânico aguarda escondido bem no fundo. É uma sensação nítida de que ele (o bebê) vai nos dominar, que tem a capacidade de roubar toda a nossa energia, toda a nossa maneira de ser no mundo… Claro, não estamos conscientes disso… Nem temos palavras para defini-lo.
As mulheres e as pessoas que estão perto de nós entram numa guerra contra o bebê e todos seus misteriosos desejos, que não são os nossos. Temos a fantasia de que se o desejo do bebê se manifestar, automaticamente nossos desejos sucumbirão.
E é inevitável! Quando surgem dois desejos simultaneamente, vivenciamos um conflito.
Aparece muito no discurso das mães essa sensação de “que tenho que ter o bebê o tempo todo no colo” e parece que não podemos… é verdade que a mulher hoje tem outras dinâmicas, outras necessidades, porém o bebê não nasce pronto; ele nasce feto e o processo de criação extra-uterina demora outros nove meses, ao contrário do resto dos mamíferos (ou seja, o bebê necessita do contato permanente fora do útero materno). Muito pouco se fala às gestantes sobre isso… Nos cursos de preparação omite-se a informação sobre as necessidades BÁSICAS dos bebês e há todo um mito de amor romântico, em que a partir da chegada deles se construirão bases sólidas, porém na maioria das vezes o que se observa é a desestruturação.
Os bebês, quando nascem, precisam estar em contato permanente com a mãe ou alguém maternal. O leite materno, além de ser o melhor e o mais rico nutriente para o bebê – o que já está cientificamente comprovado –, é a justificativa perfeita para ele entrar em contato profundo e se vincular com a mãe.
Acontece que é muito difícil para a mãe conviver ao mesmo tempo com o desejo do bebê e o seu próprio. A criança aprenderá que só existe espaço para um desejo: ou impera o desejo da mãe e o da criança fica insatisfeito, ou vence a necessidade da criança e a mãe sente raiva e rejeição. Nessa guerra já declarada quem ganha é obviamente o adulto.
Como em toda guerra, começam as estratégias para conquistar territórios, e essa será uma maneira de VÍNCULO. A criança precisará satisfazer suas necessidades básicas e para isso fará uso de todas as habilidades e ferramentas para sobreviver física e emocionalmente.
É nesse âmbito do físico que começam o enfraquecimento e a sintomatologia das primeiras doenças.
Assim, a criança verifica que ante o surgimento desses sintomas, a mãe se ocupa de levá-la ao médico e atender suas diferentes demandas. Quando a criança sara, a mãe, cansada, precisa retomar a liberdade e um pouco mais de espaço próprio.
A guerra pelo “desejo pessoal” continuará com mais força e cada vez que a criança-bebê demandar algo que o adulto não compreenda ou não tolere, o adulto contará com um sem-número de recursos psicológicos, filosóficos e médicos que justificarão que ele, como adulto, está certo.
Todo pedido manifestado pelo bebê será imenso se o adulto que materna não tolerar um desejo diferente do seu; ou se não tolerar a integração e o convívio de dois desejos.Surgem, assim, os primeiros vestígios da violência emocional, em que a mensagem é: “Não existe lugar para dois”.
É importante reconhecer esse mecanismo porque ele é muito recorrente nas sessões de terapia e no discurso dessa mãe impossibilitada de aceitar as demandas do bebê. Ela padeceu o mesmo tipo de violência invisível durante sua primeira infância, aprendeu que no intercâmbio afetivo só há lugar para um. Afirmar isso é admitir que o outro tem que deixar de existir (como sujeito do desejo).
Toda essa teoria a respeito da violência sustenta-se na observação de mulheres que não tiveram, na maioria das vezes, uma vivência infantil de amparo e cuidado maternais.
Para finalizar gostaria de me solidarizar com as mães que cuidam dos bebês solitariamente e sem contenção. A maternidade é um ciclo da vida ao mesmo tempo maravilhoso e espinhoso, porque nos conduz inevitavelmente a vivenciar o encontro silencioso e sombrio com nós mesmas, remete-nos a um jejum espiritual se nos dermos permissão para descer às nossas obscuras profundezas em busca da cura e do crescimento emocional.
Alejandra Soto Payva-Borgström
Pessoa – Mulher – Mãe parideira
Psicoterapeuta – Doula – Terapeuta Floral
E-mail: [email protected]